domingo, 23 de junho de 2013

Esperança, por Asian Dub Foundation


Asian Dub Foundation é uma banda britânica que faz um som eletrônico da melhor qualidade (ragga-jungle + guitarras). É composta por músicos-ativistas anti-racistas, imigrantes e descendentes de imigrantes asiáticos. Todo meu respeito a esses caras!

Segue uma tradução livre para o português brasileiro de uma das mais belas canções do grupo (em minha opinião). Especialmente para os momentos de angústia dos militantes progressistas de todo o mundo. Em nosso caso brasileiro, nesse momento em que a direita tenta sequestrar o movimento popular em torno do custo das passagens para sua agenda golpista.




Esperança - Asian Dub Foundation
(Asian Dub Foudation, Hope, Álbum: Tank, 2005)
[tradução * livre! *]

À frente, juventude!
No momento da verdade,
não se distraia,
não seja enganada!

À frente, juventude!
No momento da verdade,
ultrapasse os sentidos,
tenha uma visão clara!

Quando, ensurdecidos pelo som dos traidores,
sem ninguém mais em quem confiar,
empurrados para o final da escala --
Seguimos, porque assim devemos!
 

Quando nos reduzirem o último dos sentidos
e a dor nos quebrar os pensamentos,
de algum modo colaremos os pedaços
e faremos bem com tudo que aprendemos.

Quando acreditarem que estamos esgotados,
quando nos vermos empurrados ao final da fila,
tudo muda com uma palavra a uma criança,
com um breve momento de paz
nos pensamentos.

À frente, juventude!
À frente, juventude!

quarta-feira, 19 de junho de 2013

O mito da tributação elevada, por Márcio Pochmann


Para sustentar o problema que levantei em post anterior, sobre a Reforma Tributária ser o elemento-chave pra reversão das desigualdades sociais no Brasil, segue o texto de Márcio Pochmann (Folha de S. Paulo, 14.09.2008) sobre o assunto.

***

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1409200808.htm

*** O mito da tributação elevada no Brasil ***, por Marcio Pochmann

O TEMA relativo ao peso dos impostos, taxas e contribuições no Brasil permanece ainda sendo tratado na superfície. A identificação de que a carga tributária supera 35% do PIB (Produto Interno Bruto) é um simples registro, insuficiente, por si só, para permitir comparações adequadas com outros países. Ou seja, mencionar que o Brasil possui carga tributária de país rico, embora se situe no bloco das nações de renda intermediária, ajuda pouco, quando não confunde o entendimento a respeito das especificidades nacionais. Elas dificultam análises comparativas internacionais e exigem maior investigação.

Por causa disso, cabem, pelo menos, duas observações principais que terminam por desconstruir o mito da tributação elevada no Brasil.
 

Em primeiro lugar, a observação de que os impostos, taxas e contribuições incidem regressivamente sobre os brasileiros. Como o país mantém uma péssima repartição da renda e riqueza, há segmentos sociais que praticamente não sentem o peso da tributação, ao contrário de outros submetidos ao fardo muito expressivo da arrecadação fiscal.
 

Os ricos brasileiros quase não pagam impostos, taxas e contribuições.
 

Os 10% mais ricos, que concentram três quartos de toda a riqueza do país, estão praticamente imunizados contra o vírus da tributação, seja pela falta de impostos que incidam direta e especialmente sobre eles -como o tributo sobre grandes fortunas-, seja porque contam com assessorias sofisticadas para encontrar brechas legais para planejar ganhos quase ausentes de impostos, taxas e contribuições.
 

Já os pobres não têm escapatória, pois estão condenados a compartilhar suas reduzidas rendas com o financiamento do Estado brasileiro. Isso porque a tributação brasileira é pesadamente indireta, ou seja, arrecada a maior parte em impostos sobre produtos e serviços -portanto, pesa mais para quem ganha menos.
 

Além disso, há uma tributação direta, sobre renda e bens, muito "tímida" em termos de progressividade. O Imposto de Renda, que, nos EUA, tem cinco faixas e alíquotas de até 40% e, na França, 12 faixas com até 57%, no Brasil tem apenas duas, com alíquota máxima de 27,5%. Aqui, impostos sobre patrimônio, como IPTU ou ITR, nem progressividade têm.
 

As habitações dos mais pobres, por exemplo, pagam, proporcionalmente à renda, mais tributos em geral do que aqueles que residem nas mansões, enquanto os grandes proprietários de terra convivem com impostos reduzidos e decrescentes.
 

Aqueles com renda acima de R$ 3.900 contribuem apenas com 23%.
 

No entanto, quem vive com renda média mensal de R$ 73 transfere um terço para a receita tributária.
 

Em síntese, a pobreza no Brasil não implica somente a insuficiência de renda para sobreviver, mas também a condição de pagar mais impostos, taxas e contribuições.
 

Em segundo lugar, a observação de que a carga tributária corresponde à capacidade efetiva de gasto da administração pública brasileiro, conforme comparações internacionais indicam ser. No Brasil, a cada R$ 3 arrecadados pela tributação, somente R$ 1 termina sendo alocado livremente pelos governantes.
 

Isso porque, uma vez arrecadado, configurando a carga tributária bruta, há a quase imediata devolução a determinados segmentos sociais na forma de subsídios, isenções, transferências sociais e pagamento dos juros do endividamento público.
 

Noutras palavras, R$ 2 de cada R$ 3 arrecadados só passeiam pela esfera pública antes de retornar imediata e diretamente aos ricos (recebimento de juros da dívida), às empresas (subsídios e incentivos) e aos beneficiários de aposentadorias e pensões.
 

Assim, o uso da carga tributária bruta no Brasil se transforma num indicador pouco eficaz para aferir o peso real da tributação.
 

Talvez o mais adequado possa ser análises sobre a carga tributária líquida, que é aquela que, de fato, indica a magnitude efetiva dos impostos, taxas e contribuições relativamente ao tamanho da renda dos brasileiros, pois é com essa quantia que os governantes conduzem (bem ou mal) o conjunto das políticas públicas.
 

Nesse sentido, a tributação elevada é um mito no Brasil. A carga tributária líquida permanece estabilizada em 12% do PIB já faz tempo. O que tem aumentado mesmo são impostos, taxas e contribuições que, uma vez arrecadados, são imediatamente devolvidos, o que impede de serem considerados efetivamente como peso da tributação elevada.


MARCIO POCHMANN , 46, economista, professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), é presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Foi secretário do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da Prefeitura de São Paulo (gestão Marta Suplicy).

terça-feira, 18 de junho de 2013

A ordem do progresso


Penso que esse é um bom momento pra se refletir sobre essa mobilização política, e ver todas suas possibilidades.

O levante é contra um dos fatores que aumentam o custo de vida dos brasileiros, é essencialmente um levante contra as desigualdades sociais. Nesse sentido, as reclamações deveriam seguir em direção aos preços da passagem do metrô, do metrô para os pedágios, dos pedágios para toda essa privatização da educação de qualidade, da saúde de qualidade, ao custo de se ter uma moradia digna, em direção a tudo o que pesa imediatamente como uma bigorna no custo de vida de todo mundo.

Mas, considerando ser essa uma movimentação contra as desigualdades sociais, nesse momento vale sim a pena ordenar os problemas sociais mais amplos nos termos de sua real importância.

E o que é realmente importante -- o ponto chave, crucial, nevrálgico, da luta contra as desigualdades sociais no Brasil -- é a Reforma Tributária. Uma grande reforma que diminua radicalmente os impostos sobre as mercadorias (que recaem sobre todos!) e que, ao mesmo tempo, aumente exponencialmente os impostos sobre a renda dos mais ricos (!). Os impostos sobre as mercadorias nos afetam a todos, e quanto menor a renda, maior o impacto relativo desses tributos indiretos. Enquanto, no que respeita aos impostos diretos sobre a renda, a diferença atual de alíquotas é ridiculamente pouca frente à real dimensão das desigualdades no Brasil. O sistema tributário é o principal mecanismo de distribuição de renda, e a tributação no Brasil é horrorosamente regressiva (cobra proporcionalmente mais dos mais pobres que dos mais ricos).

Pra saber quão importante é esse problema, basta mexer nessa ferida: veremos os grandes tubarões aparecendo furiosamente pra defender seus privilégios.

Quanto ao problema especificamente político de como chegar lá, é preciso identificar os limites estruturais da ação política dentro da estratégia de coalizão do PT no governo nacional, o que nos mostra o filósofo da USP, Vladimir Safatle (Folha de S. Paulo, 17.04.2012), em texto que se segue: importante pra pensarmos nas grandes reformas estruturais que só uma mobilização geral de intensidade como a que vemos hoje poderia lograr: mas com um salto de qualidade que duvido que aconteça ainda nessa década.


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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/37524-os-limites-do-lulismo.shtml

*** Os limites do lulismo ***, por Vladimir Safatle

Há alguns anos, o cientista político André Singer cunhou o termo "lulismo" para dar conta do modelo político-econômico implementado no Brasil desde o início do século 21.

Baseado em uma dinâmica de aumento do poder aquisitivo das camadas mais baixas da população por meio do aumento real do salário mínimo, de programas de transferência de renda e de facilidades de crédito para consumo, o lulismo conseguiu criar o fenômeno da "nova classe média".

No plano político, esse aumento do poder aquisitivo da base da pirâmide social foi realizado apoiando-se na constituição de grandes alianças ideologicamente heteróclitas, sob a promessa de que todos ganhariam com os dividendos eleitorais da ascensão social de parcelas expressivas da população.

O resultado foi uma política de baixa capacidade de reforma estrutural e de perpetuação dos impasses políticos do presidencialismo de coalizão brasileiro.

No entanto é bem possível que estejamos no momento de compreensão dos limites do modelo gestado no governo anterior. O aumento exponencial do endividamento das famílias demonstra como elas, atualmente, não têm renda suficiente para dar conta das novas exigências que a ascensão social coloca na mesa.

É fato que o país precisa de uma nova repactuação salarial. As remunerações são, em média, radicalmente baixas e corroídas por gastos que poderiam ser bancados pelo Estado. Por isso, é possível dizer que a próxima etapa do desenvolvimento nacional passe pela recuperação dos salários.

A melhor maneira de fazer isso é por meio de uma certa ação do Estado. Uma família que recebe R$ 3.500 mensais gasta praticamente um terço de sua renda só com educação privada e planos de saúde. Normalmente, tais serviços são de baixa qualidade. Caso fossem fornecidos pelo Estado, tais famílias teriam um ganho de renda que isenção alguma de imposto seria capaz de proporcionar.

Entretanto a universalização de uma escola pública de qualidade e de um serviço de saúde que realmente funcione não pode ser feita sob a dinâmica do lulismo, pois ela exige investimentos estatais só possíveis pela taxação pesada sobre fortunas, lucros bancários e renda da classe alta. Ou seja, isso exige um aumento de impostos sobre aqueles que vivem de maneira nababesca e que têm lucros milionários no sistema financeiro.

Algo dessa natureza exige, por sua vez, uma mobilização política que está fora do quadro de consensos do lulismo.Porém a força política que poderia pressionar essa nova dinâmica ainda não existe no Brasil. Ela pede uma esquerda que não tenha medo de dizer seu nome
.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Haddad: Não seja um tecnocrata, seja um Estadista! #2



É incrível que Haddad, em meio a todos esses confrontos, tenha medo de "abalar" a relação de sua administração com a do governo do estado, a relação dele com Alckmin. Ele parece subestimar o potencial desse movimento "grass-roots" de minar a supremacia do PSDB-SP e de reembaralhar as cartas em todos os níveis da federação: porque da passagem do ônibus, a coisa segue pra passagem do metrô, do metrô para os pedágios, dos pedágios para a privatização da educação de qualidade, da saúde de qualidade, ao custo de se ter uma moradia digna, em direção a tudo o que pesa como uma bigorna no custo de vida de todo mundo.

Ainda que tenha uma participação massiva do movimento estudantil nesse levante, todas essas são bandeiras que em algum momento serão as bandeiras políticas da assim chamada nova classe média, que emergiu nos 10 anos de governo nacional do PT e que ninguém sabe ainda se será politicamente conservadora ou progressista.

Claro, Haddad tem o temor do aprendiz de feiticeiro, de falhar ao tentar manejar forças maiores que ele mesmo. Mas Haddad é o principal nome do PT a médio prazo. E se ele não se distanciar do PSDB, vão acabar abraçados se afogando. Caso Haddad não se coloque como um verdadeiro protagonista político nesse momento, todas as bandeiras que estão sendo erguidas agora -- pelos estudantes, mas futuramente pela nova classe média -- poderão ser apropriadas e retorcidas por algum outro personagem político ainda mais à direita que o Alckmin (porque tudo sempre pode piorar e esse movimento, quando se repetir, poderá acontecer como tragédia e como farsa).

Haddad: Não seja um tecnocrata, seja um Estadista! #1



Que o prefeito Haddad saiba: protestos com esse volume todo não haviam acontecido na gestão Kassab porque a Globo não havia dado visibilidade pros protestos menores que efetivamente aconteceram naquele momento. Que saiba que os meios de comunicação inflamaram os protestos pra que o prefeito Haddad caia na cama-de-gato de reagir aos protestos como todo velho político conservador/reacionário: metendo polícia em cima da manifestação.

Se o Sr. Prefeito continuar endossando a repressão e se mantendo inflexível quanto às reivindicações, vai acabar com sua identidade política progressista. A pergunta emergirá infalivelmente: cadê "o novo" da Gestão Haddad, tão alardeado na campanha eleitoral?

Que o prefeito Haddad saiba: ele pode ou se colocar à frente desse movimento, de modo progressista, o apoiando, nos surpreendendo -- ou então se deixar cair na armadilha que armaram pra ele. Nesse caso, Fernando Haddad será apenas um tecnocrata, um "gestor", e não um Estadista, um Político com "P" maiúsculo. Entenda, Sr. Prefeito, que há setores da direita também protestando, porque os custos de transporte minam o orçamento de todos, sejam quais forem suas convicções politico-ideológicas.

A Globo, na pior das intenções, abriu uma janela de oportunidade fantástica.

Que o prefeito Haddad saiba que, tomando a frente desse movimento, poderá ganhar espaço político inclusive com setores tradicionalmente antipetistas de São Paulo. Nos surpreenda, Fernando Haddad, e abra caminho pra que, em 2018, você possa quebrar a hegemonia tucana no governo do estado de São Paulo, tão daninha que é pra população paulista. Não coloque as contas públicas acima do bem-estar dos paulistas e paulistanos, muito menos acima da consciência política que está aqui em gestação.